Publicada em 06/10/2011 às 20h16m
Claudia Sarmento, correspondente (ciencia@oglobo.com.br)TÓQUIO - Num ano de notícias ruins para o Japão, a recente confirmação de que o país voltou, pela primeira vez em quase uma década, à liderança mundial da construção de supercomputadores foi comemorada pelos cientistas japoneses como uma goleada em final de Copa do Mundo. Na disputa, ficaram para trás a China e os Estados Unidos - os dois principais concorrentes no desenvolvimento da máquina mais poderosa do planeta. O supercomputador, projetado pela empresa Fujitsu, é uma das estrelas da Ceatec, a maior feira de tecnologia da Ásia, que está sendo realizada em Tóquio. Sua potência supera a dos outros cinco supercomputadores mais velozes do mundo.
A máquina, apelidada de "K", foi criada em parceria com o instituto de ciências Riken, de Kobe, com apoio do governo japonês. Quando estiver pronta para funcionar, no ano que vem, será capaz de fazer 10 quatrilhões de cálculos por segundo - o equivalente à potência de um milhão de desktops juntos. O sistema é composto por 80 mil CPUs e são muitas as suas possíveis aplicações, mas, diante dos traumas e desafios provocados pelo terremoto de 11 de março, a possibilidade de prevenir tragédias como tsunamis vem sendo apontada como uma das principais justificativas para o investimento no superequipamento. Nas palavras dos pesquisadores, numa terra sujeita a desastres naturais, como o Japão, o projeto pode significar a diferença entre a vida e a morte.
- O K poderá ajudar a salvar vidas logo após um terremoto, alertando muito mais rapidamente do que os sistemas atuais sobre a ocorrência imediata dos riscos que se seguem ao tremor - disse Masami Yamamoto, presidente da Fujitsu, lembrando que as simulações hoje levam duas horas, tempo que foi fatal para a maioria das 20 mil vítimas do 11 de março, mortos por uma onda gigante bem mais poderosa do que o imaginado, cerca de meia hora depois de a terra tremer.
O novo supercomputador poderia fazer essas simulações em dez minutos ou menos, possibilitando a divulgação de alertas sobre a iminência do perigo, garantem os líderes do projeto K. Eles não se referem apenas à previsão sobre maremotos, mas também à possibilidade de calcular estragos em prédios e na infraestrutura de uma região. O K é duzentas vezes mais rápido que o Earth Simulator - o último supercomputador japonês a atingir o topo do ranking desses megasistemas, em 2002.
As pesquisas para criar o K, iniciadas há cinco anos, já levaram mais de US$ 1 bilhão em verbas oficiais, e para a rede funcionar são consumidos US$ 10 milhões por ano em energia - o que torna a discussão polêmica num momento em que o Japão precisa de investimentos bilionários para reconstrução do nordeste do país.
As cifras já haviam sido contestadas no Congresso e a verba oficial só não foi cortada no ano passado porque um grupo de ganhadores do Nobel fez um apelo ao então primeiro-ministro Yukio Hatoyama pela manutenção do projeto, defendendo-o como um impulso essencial para um país que vem perdendo a liderança econômica e tecnológica global. A prevenção de desastres naturais não é o único campo que mobiliza os cientistas. O supercomputador ajuda no desenvolvimento de novos componentes para a indústria, por exemplo, ou de medicamentos de última geração, podendo simular com perfeição o funcionamento do corpo humano e riscos cirúrgicos, explica Yamamoto.
- A prioridade do supercomputador depende de cada país. Nos Estados Unidos e na China a área militar e o desenvolvimento de armas está entre os focos principais. No Japão, a ciência e a indústria tecnológica são o essencial - disse o presidente do Instituto Riken, Ryoji Noyori, numa palestra para jornalistas, em Tóquio.
Os japoneses garantem que não estão apenas tentando ganhar uma medalha de ouro numa maratona tecnológica, mas ter ultrapassado a China - que tirou do Japão a vice-liderança no ranking das maiores economias do mundo - ajudou a recuperar o orgulho nacional ferido. O problema, lembram os especialistas, é que o primeiro lugar no ranking das máquinas mais velozes do planeta nunca fica muito tempo nas mesmas mãos. O governo da Grã-Bretanha anunciou esta semana que vai entrar na briga, investindo US$ 220 milhões num computador de altíssima performance.
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